Não sou muito afeito a metáforas e analogias.
Talvez porque na minha cabeça as coisas sejam claras e objetivas demais, como
na manhã do meu aniversário, em que acordei, tomei um café e passei roupa.
Absolutamente nada fora do ordinário. Simples e direto. É meio engraçado esse
costume de só celebrar o envelhecer em dias específicos, como se não fossem
corriqueiros ou como se a rotina não se aninhasse neles, também.
Particularmente gosto mais da ideia de que
cada dia é uma celebração, exatamente por achar que também é festivo o
ordinário. Minha família sempre se proporcionou o privilégio desse festejo
continuo, diluído nos encontros mais corriqueiros, sempre tomados de aconchego.
Gostaria de reiterar que essa diluição não é no sentido de dissolução, mas de
capilaridade, de se espalhar e ocupar os espaços lentamente, tomando a dimensão
que se permite e necessita, como o rio que ao longo das eras vai abrindo seus
caminhos entre vales, montanhas, planícies e planaltos, transformando a
paisagem e os afetos que se banham nele. E eu dizendo que não gosto de
metáforas.
Com meus amigos não foi diferente, ainda que,
sob muitos aspectos, seja. Ao longo dos anos, entre encontros e desencontros,
distâncias continentais e rotinas que cobraram preços muitas vezes excessivos, ainda
assim conseguimos criar uma ligação que, se eu acreditasse nessas coisas, diria
que vem de outras vidas. Mesmo atravessados pela separação física, nunca
deixamos de nos fazer presentes um na vida do outro e, na medida do possível,
continuamos fazendo.
É um tipo de amizade que abraça essa
capilaridade na forma de danças bem ensaiadas, coreografadas por anos, no ritmo
que tiver que ser e que a ocasião requisitar. Os envolvidos vão, aos poucos,
entrando no tempo um do outro, entendendo o momento das entradas de forma quase
etérea, telepática. Amizade é arte performática, ainda que não seja - ou não
devesse ser - sobre performance.
Dizem que amigos são a família que a gente
escolhe, mas não acho que seja tão simples assim. Em diversos períodos da minha
vida estabeleci conexões e afetos com uma diversidade enorme de pessoas -
apesar da minha reconhecida e quase mitológica timidez - e acredito que em
maior ou menor medida consegui deixar marcas positivas na vida dessas pessoas
assim como elas deixaram na minha (se você é uma dessas pessoas, me conta o
porquê).
Contudo, e isso talvez seja até meio óbvio,
porque acontece com todos nós, muitas dessas pessoas seguiram seus rumos
totalmente indiferentes ao meu e vice-versa. Não ponho nenhum peso nisso nem
aponto dedos. A vida é essa, e fazer as pazes com esse processo nos ajuda a
entender melhor os laços que ficam. Esses, por sua vez, tomam uma dimensão
totalmente diferente, e por isso eu digo que não é tão simples quanto escolher.
As amizades sólidas se estabelecem meio sem querer, quase que por acaso, e em
algum lugar do seu âmago você sabe que quer estar junto daquelas pessoas,
simplesmente porque sim.
As duas últimas semanas da minha vida foram
tomadas desse sentimento. Junho tem uma confluência gigantesca de aniversários
de pessoas que eu amo, e felizmente a maior parte delas habita as redondezas.
Pras que estão longe, é como eu disse anteriormente, tentamos nos fazer
presentes da forma que for possível, e esse ano foi especialmente especial -
com essa redundância, mesmo, que ainda é pouca - porque pudemos passar um
período considerável na presença física uns dos outros, coisa cada vez mais
rara em razão das caminhanças da vida. E tá tudo certo.
É provável que essa seja a grande razão
dessas relações continuarem tão sólidas, mesmo depois de mais de uma década.
Não importa tempo ou distância, continuamos caminhando em paralelo, nos
celebrando sempre que possível, simplesmente porque sim. Não tem cobrança,
imposição, questionamento. Ou melhor, quase nunca, né. É bom deixar um
espacinho pra chatice moderada. Afinal de contas, isso também entra nessa soma.
Amizades sólidas abraçam os defeitos tanto quanto as virtudes, e só se
estabelecem porque aceitar o outro, em sua plenitude, ainda que seja difícil,
também fortalece os laços.
Escrevendo esse texto me pego abstraindo
sobre o que o André do passado pensaria ou escreveria sobre esse assunto. No
fim das contas, acho que ele, assim como eu, diria pra eu parar de perder tempo
com esse tipo coisa, porque não importa. Não que não tenha nenhuma relevância,
mas concordamos que mais importante do que isso é o momento presente e o que
vem pela frente, que só faz sentido porque temos esse monte de gente pra amar e
aguentar nossas chatices e reclamações sobre por que diabos as pessoas não
andam do lado certo da calçada - ou qualquer umas dessas coisas que me tira do
sério sem nenhum motivo concreto.
Enfim, acho que chega de sentimentalismo.
Volto na próxima.
(Amo vocês)
Muito bom....
ResponderExcluirNossa amizade se solidificou por conta dos aspectos admiráveis que não desenvolvi em mim, por esta razão o elo vai se soldando naturalmente
Eh noix champs
🎶Nossos destinos foram traçados na maternidade 🎶
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